31/07/2010

Poesia

Gastei uma hora
pensando um verso
que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
inunda minha vida inteira.
Carlos Drummond de Andrade

22/07/2010

Carapuça

Que personagem avaro
consegue ver o céu
com indiferença?
Com a sua cara bizarra,
parece vermes
das fezes de abutres!
É formado por contágio directo,
transformado em parasitas.
No corpo vegetativo
é um protozoário na propriedade alheia.
Uma tonelada de anti virose
não seria o suficiente para imuniza-lo,
não reage mais, não há cura...
Não consegue labutar,
colhe os frutos sadios,
suga a carniça do próximo
e ainda critica o melhor sucedido.
Só quer o poder pelo poder.
Um chatim!
por Tossan

14/07/2010

Classe Média

Sou classe média
Papagaio de todo telejornal
Eu acredito
Na imparcialidade da revista semanal
Sou classe média
Compro roupa e gasolina no cartão
Odeio “coletivos”
E vou de carro que comprei a prestação
Só pago impostos
Estou sempre no limite do meu cheque especial
Eu viajo pouco, no máximo um pacote cvc tri-anual
Mais eu “to nem ai”
Se o traficante é quem manda na favela
Eu não “to nem aqui”
Se morre gente ou tem enchente em itaquera
Eu quero é que se exploda a periferia toda
Mas fico indignado com estado quando sou incomodado
Pelo pedinte esfomeado que me estende a mão
O pára-brisa ensaboado
É camelo, biju com bala
E as peripécias do artista malabarista do farol
Mas se o assalto é em moema
O assassinato é no “jardins”
A filha do executivo é estuprada até o fim
Ai a mídia manifesta a sua opinião regressa
De implantar pena de morte,
ou reduzir a idade penal
E eu que sou bem informado concordo e faço passeata
Enquanto aumenta a audiência e a tiragem do jornal
Porque eu não “to nem ai”
Se o traficante é quem manda na favela
Eu não “to nem aqui”
Se morre gente ou tem enchente em itaquera
Eu quero é que se exploda a periferia toda
Toda tragédia só me importa quando bate em minha porta
Porque é mais fácil condenar quem já cumpre pena de vida

Composição: Max Gonzaga

02/07/2010

Bilhete

Se tu me amas,
ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres, enfim,
tem de ser bem devagarinho,
Amada, que a vida é breve,
e o amor mais breve ainda...
Mário Quintana